Artigo: Jesus acionou o shift do seu teclado, mudou a palavra “peixes” para a palavra “homens” e reu

07/02/2010 - 0:00 - UCDB

Fonte: Pe. Pedro Pereira Borges

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Uma pessoa experiente em sua profissão pode ter as mais diversas atitudes diante das novidades que surgem. Por exemplo, quando surgiu o telefone, os donos da ATT, encarregada dos telégrafos, nos Estados Unidos, logo começaram a denegrir aquele novo instrumento de comunicação. Para não perder o mercado, sabotavam as linhas telefônicas cortando os seus fios. Um administrador acostumado com um modelo de administração eficaz, baseado em planilhas especiais, que somente ele entende, quando vê surgir um programinha de computador eficiente e acessível a todos, pode não querer mudar a sua postura, porque acredita que as novidades podem atrapalhar as vendas da empresa. Ele só se convence a mudar no dia em que seu chefe diz que será substituído por um funcionário mais novo.

Os pescadores abordados por Jesus no lago de Tiberíades eram homens experientes na sua profissão. O seu relógio biológico já estava acostumado a uma planilha mensal de dias apropriados para pescar. Certamente iam para o mar somente durante as luas minguante e crescente porque naqueles dias a correnteza dos rios é mais fraca e as marés são mais suaves. Jesus contradisse toda essa expectativa. Tendo o domínio sobre as forças da natureza, Ele sabia o lugar exato onde se encontravam os peixes e conduziu os discípulos para lá.

É isso o que diz o evangelho deste 5º domingo do tempo comum, tirado de Lucas 5,1-11. Esse trecho pode ser dividido em pelo menos três momentos.

O primeiro éa descrição dos lugares e da primeira pregação de Jesus. Depois de ter apresentado seu programa de trabalho na sinagoga de Nazaré, Jesus foi para a margem do lago de Genesaré, que tambéméchamado de Lago de Tiberíades. Estando nas margens do lago, viu ali duas barcas ancoradas. Uma delas era de Pedro. Os pescadores haviam descido e estavam limpando as redes. Ele subiu na barca de Simão, e pediu-lhe para que se afastasse um pouco da margem, porque a multidão se comprimia ao seu redor. Da barca Ele ensinava à multidão.

O segundo momento é o da pesca milagrosa. Após falar para o povo, Jesus passou a dar atenção aos pescadores. Eles nada haviam conseguido pescar durante a noite. As redes voltaram vazias. Jesus pediu que eles levassem a barca para um lugar mais profundo. Mandou-os lançar as redes, em pleno dia. Pedro ficou espantado com as palavras de Jesus, porque era o dono do barco: “Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos”. Mas obedeceu: “em atenção à tua palavra, vou lançar as redes”. Então, aconteceu o que ele não esperava. As redes ficaram tão cheias de peixes que tiveram que pedir ajuda para que não rasgassem.

O terceiro momento é o chamado que Jesus fez aos pescadores para se tornarem seus discípulos. Pedro, diante do milagre da pesca, não se conteve. Segundo Lucas, não somente ele, mas também os seus companheiros de trabalho, Tiago e João, ficaram espantados com o que havia acontecido. Pedro lançou-se aos pés de Jesus e lhe pediu: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou um pecador!”

Jesus certamente ficou admirado com a atitude daqueles homens simples. Eles haviam presenciado apenas um momento de tudo o que haveriam de ver mais para frente, mas já faziam uma reflexão sobre si mesmos – “sou um pecador” – e, mesmo tendo ainda alguma resistência ao novo – “afasta-te de mim” –, rendiam-se ao milagre de Jesus a ponto de se lançarem aos seus pés.

Para Ele, estavam ali, diante de si, pedras brutas que deveriam ser lapidadas, para se tornarem pedras de grande valor. Por isso, disse a Pedro, e em consequência, aos outros: “Não tenhas medo! De hoje em diante tu serás pescador de homens”. Diante desse convite, Pedro e seus sócios não hesitaram. Levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e o seguiram.

O tema desse trecho do evangelho é o chamado a ser discípulo de Jesus. Em primeiro lugar, Ele se viu assediado pelas multidões. Percebeu que, sozinho, nada poderia fazer. Como haveria de conseguir pessoas que pudessem ajudá-lo? Como se tratava de um trabalho novo, Ele precisava de gente de mente aberta para dar prosseguimento à sua atividade. Mas, para conseguir esse tipo de “profissional”, sem estudos, era preciso algo que realmente chamasse a atenção de alguns para o seu projeto. Encontrou nos pescadores esse tipo de pessoa. Eles eram como pedras brutas que deveriam ser lapidadas. Para tanto, teve que mostrar que as convicções naturais que eles tinham podiam ser mudadas. A partir daquele momento, eles não deviam seguir a lua e suas fases, mas a Ele que levava para as águas mais profundas dos mistérios humanos. Mesmo que eles fossem homens experientes na pesca, faltava-lhes o verdadeiro conhecimento da natureza. Esse conhecimento, Jesus podia oferecer-lhes. Por isso, mandou-os ir para o lugar apropriado. Ali, pode realizar o seu milagre.

Era como se Jesus tivesse estudado em profundidade o comportamento daqueles pescadores. Para mudar as suas convicções era preciso algo que provocasse impacto. A pesca milagrosa foi a maneira que Jesus encontrou para demovê-los de suas crendices e passar a aceitar uma nova maneira de lapidar o coração do mundo. Era como se Ele tivesse um teclado cujo comando estava conectado à mente e ao coração de cada um daqueles pescadores. Assim, apertou um shift e mudou a palavra “peixes”, minúscula, para a palavra “homens”, maiúscula. Naquele momento, aqueles homens deixaram de ser pescadores para se tornarem discípulos de Jesus.

Quantas informações novas não chegaram atéeles. Jesus mostrou-lhes o seu poder e seu conhecimento sobre o mar, mesmo sem ser pescador, e eles reagiram dando-lhe o crédito da fé.

O que aconteceu realmente? É como se a empresa de telégrafos norte americana tivesse percebido que melhor do que se comunicar por meio de códigos e sinais é ouvir a voz dos seus clientes; é como se um administrador, ávido por novos modelos de gestão, captasse logo que tudo se torna mais fácil se ele se utiliza das novas tecnologias. O que aconteceu com os pescadores foi isso: eles perceberam que deveriam mudar a sua maneira de pescar. Por que ir buscar o peixe nos lugares mais profundos, quando, na verdade, eles estavam à margem esperando por Jesus. Então, passaram a usar a tecnologia de Jesus e foram decisivos para mudar o mundo.

Todavia, para mudar o jeito de pescar daqueles homens, Jesus teve que mudar uma pessoa em especial. Essa pessoa se chamava Pedro. Pedro tinha uma empresa, juntamente com seu irmão André e outros dois irmãos, Tiago e João. Ao que tudo indica, Pedro dava as ordens e eles cumpriam. Jesus percebeu isso e subiu justamente em sua barca. Mesmo que fosse o capitão, deu a Pedro as ordens necessárias para que a pesca acontecesse. Ele não acreditava no que estava acontecendo. Mas foi por ter acolhido a ordem de Jesus que Pedro passou das próprias certezas à fé em Jesus.

Isso significa que Jesus játinha em mente qual seria a posição de Pedro na construção do Reino de Deus. Ele deveria ser o capitão da sua barca, a Igreja. Quem obedece a Pedro, obedece a Jesus. A Jesus, não importava a sua condição de pecador. Importava-lhe, sim, a aceitação da sua palavra, a sua capacidade de comandar a barca da Igreja e a sua capacidade de envolver os outros – “fizeram sinal aos companheiros da outra barca, para que viessem ajudá-los”.

Hoje, Jesus continua no comando de sua Igreja. Ele também continua subindo na barca da nossa vida, a fim de nos indicar por quais caminhos nós devemos seguir. Para realizar a sua missão de construir o Reino de Deus na terra, Ele precisa de pessoas abertas e generosas, que aceitem a sua palavra e lancem as suas redes nas águas profundas da violência, da miséria, do divórcio e do desrespeito à vida, para transformar este mundo num lugar de paz, de riqueza espiritual, de famílias unidas pelo amor e de vidas respeitadas desde o seu nascimento.

Seráque nós aceitaríamos ser transformados por Jesus? Será que as pedras brutas que somos podem ser transformadas em diamantes finamente lapidados? Para que descubramos isso, é preciso que deixemos que Jesus suba na barca da nossa vida e nos ajude a vencer as nossas convicções pessoais e a dar o passo decisivo de segui-lo por onde quer que Ele for.

Pe. Pedro Pereira Borges - Pró-Reitor de Pastoral/UCDB

Foto:
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