17/10/2010 - 1:00 - UCDB
Fonte: Prof. Dr. Neimar Machado de Sousa
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Prof. Dr. Neimar Machado de Sousa¹
Em 11 de outubro de 1977 ocorreu a criação política do sonhado estado de Mato Grosso do Sul. O evento coroou lutas antigas que vinham desde 1932. Em 2010, a comemoração da divisão permite a comparação com o estado construído. Decorridos 33 anos de separação dos “terríveis políticos do norte”, como diziam os divisionistas mais exaltados, política e sonho ainda não se juntaram, pois o jovem estado viveu um processo de modernização arcaizante.
O estado nasceu de um ato autoritário do presidente Ernesto Geisel durante o governo militar que chegou a impor um governador, pois não havia consenso entre as lideranças regionais da ARENA. A oposição do MDB, muito forte em Campo Grande, sequer foi chamada para as discussões secretas nos bastidores da divisão. A divisão administrativa de 1977 lembrou o levante oligárquico de 1892 dos primeiros coronéis separatistas: Jango Mascarenhas, João Caetano Teixeira Muzzi e Barros Cassal.
Uma das razões alegadas pelo governo militar foi criar, de acordo com a ideologia da época, um estado modelo, tecnicamente gerenciado e eficiente. A derrubada do governador nomeado, Harry Amorim Costa, pelas elites políticas sulistas significou a substituição desse projeto pela crise institucional e a imposição, entre 1979 e 1980, de três governadores.
A comemoração atual permite olhar novamente parta o passado e perguntar sobre os legítimos representantes da sociedade sul-mato-grossense organizada na gestão desse estado. Elucidativo da falta da consulta à sociedade civil, foi a reorganização às pressas da Liga Sul-Mato-Grossense em 1977 pelo incansável Paulo Coelho Machado para conferir legitimidade ao projeto de Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva.
Com relação à história e a identidade do jovem Mato Grosso do Sul, pode-se sugerir dois símbolos identitários ligados entre si: o índio, apresentado artisticamente por Conceição dos Bugres, e o boi, estetizado pelo artista plástico Humberto Espíndola. É importante trazer à memória que foram os índios Itatim os pioneiros da pecuária no tempo em que viveram nas missões jesuíticas de Nossa Senhora da Fe do Taré e Santo Inácio de Caaguaçu, entre 1631-1659. Essas duas missões existiram no território atual do Mato Grosso do Sul e, após sua destruição pela bandeira de Raposo Tavares, o rebanho continuou se multiplicando nos campos de Vacaria.
Somos, desde 1631, uma região de pecuária. O gado, na região entre os rios Taquari e Apa, foi trazido pelos padres jesuítas do Colégio de Assunção, fundado em 1593, para as missões indígenas. Assim, os dois símbolos artísticos da cultura sul-mato-grossense estão historicamente relacionados. Os índios, ao perderem o direito aos campos, perderam as vacarias.
Segundo o IBGE (2004), o estado tem 12% do rebanho bovino nacional de 200 milhões de cabeças e o município número um em gado é Corumbá. Curiosamente, o setor responde por 24,96% da arrecadação de ICMS e o comércio por 40%.
O estado, seguindo a tendência da América Latina, urbanizou-se rapidamente após a divisão. A concentração populacional nas cidades e a implantação de uma agropecuária moderna diminuíram o emprego de mão-de-obra rural, concentraram propriedades e produtos. Essa conjuntura econômica, nos últimos 30 anos, influenciou alguns efeitos demográficos. Entre eles, temos o incremento populacional na capital do estado que em 2009 contava 755 mil habitantes.
Outro resultado da modernização arcaizante é a quase erradicação do plantio da erva-mate. O mate, nos tempos da Cia Matte Laranjeira, era exportado para Buenos Aires. Atualmente, a maior parte da erva-mate para o Tereré e Chimarrão é importada de estados vizinhos.
33 anos após a criação de Mato Grosso do Sul e muitos governos oligárquicos depois, percebemos que o estado sonhado ainda não foi construído. Apesar das dificuldades, o estado vem construindo sua rica identidade fronteiriça, mestiça e híbrida. Acredito que os futuros governantes poderão avançar em direção ao objetivo de um estado justo e desenvolvido para todos, diferente dos demais, se souberem implementar melhores políticas de desenvolvimento, especialmente em relação à educação.
[1] Professor de História Regional, pesquisador na Universidade Católica Dom Bosco e presidente da Associação Nacional de História, seção MS. E-mail: professor_neimar@hotmail.com
Evento é voltado para estudantes do ensino médio de escolas públicas e privadas