Artigo: Ser Rei é agir no coração das pessoas para torná-las responsáveis pelo mundo

22/11/2009 - 0:00 - UCDB

Fonte: Pe. Pedro Pereira Borges

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Na semana que passou, nós assistimos à eleição do primeiro-ministro da Bélgica como primeiro presidente da Europa. Após a queda do Império Romano do Oriente, em 1453, havia começado um processo de acomodação das fronteiras entre os países europeus que foi criando diversas nações. Até hoje essas fronteiras ainda estão sendo redefinidas.

O primeiro presidente da Europa, após o Império Romano, não terá apenas um cargo figurativo. Ele terá que liderar um bloco cuja riqueza se equipara à dos Estados Unidos, mas com muitas questões a serem resolvidas, principalmente com a entrada de países do antigo bloco comunista na União Europeia.

Porém, duas nações hoje têm grande poder de decisão em nível mundial. Os Estados Unidos e a China comandam as grandes discussões no plano econômico. Entre esses dois países está a nação mais rica do mundo e aquela que cresce mais de 8% ao ano. Todas as decisões políticas em nível mundial passam necessariamente por eles e pelos países que compõem o Conselho Permanente de Segurança da ONU.

Ainda quando existia o Império Romano, tanto o do Oriente quanto o do Ocidente, surgiu o cristianismo como proposta alternativa ao paganismo e a todo sistema político ou econômico que possam existir. Um homem-Deus, chamado Jesus de Nazaré, veio ao mundo trazendo uma proposta nova que superava todas entre as fronteiras das nações com uma Lei positiva chamada de maneira muito apropriada de Bem-Aventuranças. Essa Lei, que em nada contradizia os Dez Mandamentos dados por Deus ao povo judeu, também ensinava ao ser humano que o caminho da paz, da justiça e da solidariedade está baseado no amor e no perdão.

As primeiras comunidades cristãs viveram com intensidade a proposta de Jesus conforme o ensinamento dos apóstolos. Elas eram admiradas porque entre os cristãos não havia necessitados, e todos repartiam o que tinham para que todos tivessem o mínimo necessário para viver.

As comunidades cristãs dos dias de hoje são a continuação desse projeto iniciado por Jesus. Muito antes de a Europa se unir ou de o Mercosul a Apec surgirem, os cristãos já haviam criado a consciência de que o projeto de Deus é que todos sejam um, isto é, que a humanidade viva na unidade. A pátria dos cristãos é o mundo, mas um mundo que não admite fronteiras.

Neste 34º domingo do tempo comum, celebramos a grande festa de Cristo Rei e Senhor do Universo. Durante a sua vida terrena, Jesus percebeu em muitas ocasiões que o povo queria aclamá-lo como rei. No entanto, Ele sempre se recusou e até se afastava do povo quando percebia nele esse desejo.

No evangelho deste domingo, de João 18,33b-37, Ele se encontra diante de Pilatos. Justamente nesse momento, Jesus afirma que é Rei: “33bPilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: “Tu és o rei dos judeus?” 34Jesus respondeu: “Estás dizendo isto por ti mesmo ou outros te disseram isto de mim?” 35Pilatos falou: “Por acaso sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?” 36Jesus respondeu: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui”. 37Pilatos disse a Jesus: “Então tu és rei?” Jesus respondeu: “Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz”.

Por que Jesus, justamente diante de Pilatos, quis afirmar que é Rei? Em primeiro lugar, para diferenciar o sentido da palavra Rei. Rei é uma pessoa ligada à política, ao domínio, ao poder, à lei. Ser rei ou presidente é o desejo de muitas pessoas com projetos às vezes ligados a grupos de interesses, que acreditam estar representando o desejo de toda uma nação.

Para Jesus, ser Rei é ter a capacidade de unir todos os homens e mulheres de boa vontade em torno de um projeto comum baseado em valores como o amor, a justiça, a paz, a solidariedade, o perdão, a misericórdia e a unidade. Este não é um projeto político. É um projeto que faz o ser humano mudar a sua maneira de agir, porque todos se colocam no mesmo nível, e todos se solidarizam em torno de um projeto comum. Ser Rei para Jesus é, sobretudo, agir no coração das pessoas para torná-las responsáveis pelo mundo. Nenhum rei ou presidente deste mundo é capaz de fazer isso, porque seus interesses estão ligados ao seu país, ao seu povo ou mesmo ao seu partido.

O projeto de Jesus não é para um povo, é para toda a humanidade. Por isso, ele não admite fronteiras. Foi por essa razão que seus ensinamentos, seu projeto e sua experiência com os apóstolos foram capazes de romper com as fronteiras e chegar a todos os cantos do mundo.

Infelizmente, os cristãos se dividiram, criaram barreiras entre si. Mas hoje há um processo intenso de diálogo entre as diversas comunidades cristãs do mundo inteiro. Há pouco tempo, o Papa pode reunir-se com 229 Convenções Batistas espalhadas pelo mundo; há pouco tempo, ainda, o Papa lançou um documento sobre a acolhida dos padres e bispos anglicanos que queiram retornar para o seio da comunidade católica; há um diálogo muito profundo entre católicos, ortodoxos, luteranos, metodistas, entre outros, no sentido de caminharem rumo a uma comunhão plena. Todos os anos se realizam encontros interreligiosos entre cristãos e membros de outras religiões não cristãs. Tudo isso é sinal de que o projeto de Jesus de reunir todos os povos como só rebanho e em torno de um só pastor continua mais vivo do que nunca. Esse projeto é diferente da União Europeia, do Mercosul ou de qualquer bloco reunido em torno de interesses econômicos. Será Ele, Cristo, o Filho de Deus encarnado, que será capaz de reunir todos os povos da terra para a ceia da comunhão eterna, na qual todas as esperanças humanas encontrarão sua resposta definitiva.

Então, nós somos os soldados de Cristo que o defendem neste mundo, como o faziam as primeiras comunidades, dando exemplo de amor, de escuta à Palavra de Deus, de oração e de comunhão fraterna. Nós o defenderemos diante dos presidentes e reis deste mundo, porque Ele é a resposta para as nossas perguntas mais profundas. Como cristãos, devemos ter a coragem de defender valores da família, da vida, da justiça e da solidariedade. Justamente quando tivermos consciência disso, Cristo nos reunirá diante do seu trono para nos fazer participar do seu Reino. Seu Reino não é deste mundo, mas está presente neste mundo em cada um de nós.

No tribunal judaico do Sinédrio, Jesus tinha aplicado a Si o título de “Filho do homem”. Agora, no tribunal romano diante de Pilatos, confirma o título de Rei, que os seus inimigos citam contra Ele como motivo de condenação. Mas, só os que são da verdade podem compreender o que diz a sua voz.

Portanto, há dois mil anos, Jesus dizia ao império romano, e hoje repete a todas as nações com suas formas de governo: “O meu reino não é deste mundo”. Derramando seu sangue, libertou-nos do pecado, do não-reino: da hipocrisia, da fraude, da corrupção, das segundas intenções, da dominação que explora. Seu reino vem do céu, das nuvens, mas é para ser plenamente vivido na terra, é para fermentar a inteira humanidade.

Esse reino de Jesus “não se dissolverá”, porque está baseado no amor, e o amor é eterno, “jamais acabará”. Construído no amor, seu reino é vivido na acolhida, no perdão, na solidariedade sem medidas nem condições. Jesus, em sua passagem entre nós, inaugurou, viveu plenamente e anunciou a todos esse reino, esse modo de viver.

Na Eucaristia, no Corpo e Sangue de Jesus, entregues por causa do reino, busquemos a força de dar continuidade a esse seu mesmo reino: “Todo aquele que é da verdade, escuta a minha voz”!

A paz do Senhor esteja com todos vocês neste grande dia de Cristo, Rei e Senhor do Universo!

 

 

Pe. Pedro Pereira Borges

Pró-Reitoria de Pastoral